Jovem que aplicou café com leite na veia de idosa tinha só 3 dias de estágio

Família posa com foto da idosa Palmerina Pires Ribeiro, de 80 anos. Os parentes acusam uma estagiária do Posto de Atendimento Médico de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, de aplicar por engano café com leite na veia da idosa e causar sua morte. (Foto: Renata Soares/G1)Em depoimento na 64ª DP (São João de Meriti), na tarde desta quarta-feira (17), a estagiária de enfermagem Rejane Moreira Telles, de 23 anos, que injetou café com leite na veia de  Palmerina Pires Ribeiro, de 80 anos, que morreu logo após, afirmou que a técnica de enfermagem responsável não acompanhou o procedimento. Segundo o delegado Alexandre Ziehe, Rejane estava há apenas três dias no estágio. O caso ocorreu no Posto de Atendimento Médico (PAM) de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, no último domingo (14).

“A estagiária diz que recebeu uma ordem de uma técnica de enfermagem do PAM, que teria dito o seguinte: ‘Dá o leite para a paciente na sonda. Pega uma seringa naquele armário e administra o leite.’ Enquanto isso, segundo a estagiária, a técnica ficou usando o celular, jogando ou brincando, sentada em um canto da sala”, contou o delegado, titular da 64ª DP.

Ziehe explicou que Rejane tinha começado o aprendizado no PAM de São João de Merititrês dias antes, e que ela teria recebido a ajuda de uma outra estagiária, que estava há somente um dia na unidade de saúde. “Só quem pode fazer qualquer procedimento com o paciente é o enfermeiro, ou o técnico de enfermagem do hospital, ou o supervisor do estágio, que é um enfermeiro habilitado”, afirmou Ziehe, que esclareceu ainda que qualquer atividade realizada por estagiários devem ser supervisionada pelo enfermeiro ou técnico responsável.

De acordo com o delegado, em depoimento, a técnica de enfermagem se isentou de culpa. “Ela (a técnica de enfermagem) disse que as estagiárias fizeram a aplicação, sozinhas, por conta e risco delas”, afirmou Ziehe. “Eu ainda não estou convencido da conduta de todos os envolvidos. Por isso ainda temos que apurar e ouvir as outras pessoas, para confrontar os depoimentos e, se for necessário, realizar até uma acareação”, acrescentou.

Segundo Ziehe, a outra estagiária ajudou Rejane a segurar a cânula da sonda de acesso venoso. Logo após a aplicação incorreta, Palmerina começou a passar mal. “De acordo com os depoimentos, a filha da idosa, que a princípio não teria visto nada de irregular, quando olhou de novo, viu um resquício de leite e gritou: ‘Vocês estão dando leite na veia da minha mãe!’ E todos começaram a correr”, contou o delegado.

“A outra estagiária também vai ser ouvida e, se ela teve participação, também vai ser punida da mesma forma, por ter auxiliado”, afirmou Ziehhe. Segundo ele, as duas estagiárias e técnica de enfermagem podem responder por homicídio culposo.

O delegado explicou que o estágio das jovens era um convênio entre a Prefeitura de São João de Meriti e o Centro Educacional Victor e Wladimir (Ceviw), onde Rejane a outra estagiária estudam. De acordo com Ziehe, a escola não deve ser processada criminalmente, já que, a princípio, o supervisor do estágio não teve responsabilidade pelo ocorrido, já que, na hora da aplicação na sonda, as estudantes estavam sob a orientação da técnica de enfermagem do PAM.

“No PAM, o supervisor se apresentou assim que soube do ocorrido. O dono da escola também foi ouvido nesta quarta-feira, e apresentou o contrato do convênio com a prefeitura. Tudo nos leva a crer que é uma escola devidamente credenciada”, disse o delegado. “A estagiária, inclusive, admite que recebeu instrução em uma aula teórica de não realizar procedimentos sem supervisão”, acrescentou o delegado.

Família posa com foto de Palmerina, de 80 anos (Foto: Renata Soares/G1)

Procurado pelo G1, o diretor do Ceviw não foi localizado nem nas unidades de ensino nem em seu telefone particular.

O Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro(Coren-RJ) informou que, diante do cenário encontrado, estuda a possibilidade de interditar eticamente os profissionais do Posto de Atendimento Médico (PAM) de São João de Meriti para garantir a segurança da população e a integridade dos profissionais de enfermagem.

Segundo o Conselho, nesta quarta-feira (17), uma delegação do Coren-RJ, comandada pelo presidente Pedro de Jesus Silva, se disse surpreendida com “diversas medidas arbitrárias” tomadas logo após a morte da idosa, como a notícia da exoneração da enfermeira responsável técnica e de outros profissionais de enfermagem do Posto de Atendimento Médico (PAM).

O subsecretário de Comunicação Social da Prefeitura de São João de Meriti, Marco Antônio Canosa, informou que as enfermeiras supervisoras de plantão Viviane Souza da Silva e Sônia Morgado e as técnicas de enfermagem de plantão no setor de enfermaria (onde estava internada Palmerinda), Adrielle da Silva e Rayane Brito da Silva Inácio, foram exoneradas. Já a coordenadora de enfermagem Francimar Garcia Modesto foi afastada de sua função.

Aplausos no enterro
Palmerina foi enterrada na manhã desta terça (16) no Cemitério Vila Rosali, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, sob aplausos de amigos e parentes. Ela deixou 16 filhos, 30 netos e 12 bisnetos.

Revoltados, familiares e amigos não se conformam com o atestado de óbito, que não específica a causa da morte da idosa, ocorrida no último domingo, no Posto de Atendimento Médico (PAM) de São João de Meriti. A filha Zilma Ribeiro, que é agente de saúde no Rio, exibiu o documento onde aparecem como causadores da morte de Palmerina infecção urinária, infecção pulmonar e uma doença não identificada.

“Que doença é essa que aparece como XXX, no atestado? Isso é um absurdo. Minha mãe estava prestes a deixar o hospital. Já estava com o pulmão limpo e a urina límpida. Estava só terminando a sequência do antibiótico para ir para casa”, reclamou a filha, que confundiu os símbolos usados para finalizar a frase do atestado de óbito com a falta de uma explicação sobre a doença declarada no documento.

Parentes suspeitam ainda que, além da aplicação de café com leite na veia, Palmerina tenha sido vítima de excesso de medicamentos. Zilma contou que a diretora do PAM teria informado que tinham aplicado na paciente uma determinada substância para tentar reverter os danos causados pela injeção errada.

“Esse medicamento, segundo a médica,  não era o ideal. Ele foi aplicado. Mas logo depois,  ela disse que tinha encontrado um outro medicamento mais indicado e que ele tinha sido injetado na minha mãe. Se isso aconteceu, minha mãe pode ter morrido por excesso de medicação”, disse Zilma.

Atestado de óbito de Palmerina: infecção urinária, infecção pulmonar e doença não especificada (Foto: Alba Valéria Mendonça/ nG1)Atestado de óbito de Palmerina: infecção urinária, infecção pulmonar e doença não especificada (Foto: Alba Valéria Mendonça/ nG1)

A filha Loreni,  que estava com Palmerina no hospital,  diz que viu tudo e não se conforma com o descaso dos responsáveis do posto de saúde.

“Não tenho dúvidas de que era café com leite, que a estagiária injetou na minha mãe.  Enquanto tiver olhos para ver e boca para falar vou dizer isso. Foi mais de meio copo de café com leite. Os médicos já reconhecem que houve erro, mas o atestado de óbito não mostra nada”, disse Loreni indignada.

Os parentes acusam uma estagiária pelo erro no procedimento. Durante o velório e o enterro, parentes e amigos de Palmerina exibiram cartazes de protesto contra a morte da idosa.

“Isso é um absurdo, quem vai trazer minha avó de volta? Ninguém faz nada, ninguém nos dar uma satisfação, ninguém do hospital sequer respeita a dor da nossa família. Minha avó era uma senhora muito querida e amada. Isso é um grande descaso”, relatou um dos netos da vítima, Gilberto Ribeiro, de 36 anos, que acrescentou ainda que no momento em que o procedimento foi realizado, a estagiária estava sem supervisora.

“Minha tia estava com ela e disse que na hora em que a estagiária foi aplicar o café com leite na sonda, não havia nenhuma enfermeira supervisora por perto. Aí em vez de ela colocar o café na sonda do nariz, que iria direto para o estômago da minha avó, ela colocou o alimento na sonda que levou o café para a veia e minha avó morreu”, completou.

Segundo uma das filhas de Palmerina, Ilma Ribeiro, a mãe ficou internada com suspeita de pneumonia durante 10 dias no Hospital de Saracuruna, também na Baixada. Em seguida, ela apresentou uma melhora e foi para casa. No entanto, no dia seguinte, a idosa passou mal novamente e foi encaminhada para o PAM de São João, de onde, segundo os filhos, ela receberia alta nesta segunda.

Procurada pelo G1, em nota, a Prefeitura de São João de Meriti informou que uma sindicância foi aberta para esclarecer o caso e que a estagiária e as enfermeiras supervisoras foram afastadas de suas funções. (Veja a íntegra a nota ao final desta reportagem.)

Caso semelhante
Na quarta-feira (10), uma outra  idosa, de 88 anos também morreu após uma enfermeira injetar sopa em sua veia.  O caso ocorreu em Barra Mansa, na Região Sul Fluminense. No mesmo dia, o Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu uma sindicância para apurar o ocorrido.

Leia a íntegra da nota enviada pela Prefeitura de São João de Meriti
“A Prefeitura de São João de Meriti, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, informa que está sendo aberta sindicância administrativa para esclarecer o caso e que tanto a estagiária técnica de enfermagem, como as enfermeiras supervisoras de estágio e de plantão na unidade de saúde foram afastadas de suas funções. Os responsáveis pelo erro serão punidos exemplarmente e deverão também responder a inquérito aberto na 64ª DP (Vilar dos Teles)”.

Fonte: G1

Blog do Deputado Federal GONZAGA PATRIOTA (PSB/PE)

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