Escolaridade, e não renda, determina adesão à internet no país, diz Ibope

A escolaridade influencia mais na adesão à internet em um município brasileiro do que a renda média da população. De acordo com o estudo Target Group Index, realizado pelo Ibope, em famílias de igual renda, a presença da internet é maior quando uma pessoa tem mais escolaridade.

Entre as famílias com renda mensal de R$ 300 a R$ 600, por exemplo, a adesão à internet é de 10% entre as quais o chefe do domicílio é analfabeto ou tem apenas instrução primária. Já nas casas com essa mesma renda, mas com um membro da família com ensino superior, a penetração da internet chega a 50%.

A pesquisa Target Group Index avaliou o comportamento de consumo de 20 mil pessoas entre 12 e 75 anos. O estudo foi feito de fevereiro de 2011 até o mesmo mês de 2012 em dez regiões metropolitanas do Brasil e cidades com mais de 50 mil habitantes do Sul e Sudeste, que apresentam uma melhor infraestrutura de acesso à internet.

Conforme José Calazans, analista do Ibope, a pesquisa foi aplicada em cidades maiores, pois elas sofrem menos influência da infraestrutura. “Quando a infraestrutura é eficiente, a influência da escolaridade fica mais clara”, explicou.

Dados do Censo
Para comprovar a influência da escolaridade no acesso à internet no Brasil, o Ibope aplicou esse conhecimento sobre todos os municípios por meio dos dados do Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa concluiu que quanto maior for a renda e a escolaridade da cidade maior será a penetração da web. Segundo Calazans, a cada R$ 50 acrescentados à renda média da população do município, cresce um ponto percentual o índice de adesão à rede.

No entanto, o Ibope encontrou cidades que fogem da média nacional – apesar de renda ou escolaridade baixa, a penetração à internet é maior do que a esperada. Municípios pequenos do Nordeste conseguem ter um acesso à web maior do que seus vizinhos pela população mais escolarizada, conforme a pesquisa. Essas cidades têm como principal característica a presença de uma universidade próxima.

Um exemplo é Lucrécia (RN), distante 290 km de Natal. Pela renda média (R$ 673 por família), a cidade deveria ter 13% de suas casas com internet. Porém o acesso chega a 15% dos domicílios. Segundo dados do Censo 2010, 65% da população de Lucrécia não têm instrução, enquanto 5% já concluíram a faculdade.

Internet via rádio
Primeiro da família a ter curso superior completo, Wellisson Costa, de 24 anos, acessa a internet todos os dias da casa onde mora em Lucrécia. Filho de trabalhadores rurais, ele comprou seu primeiro computador em 2010 para fazer pesquisas para a faculdade. Wellisson se formou em março de 2012 na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), na unidade de Patu (RN), a 30 minutos de Lucrécia.

Logo depois de adquirir o netbook, ele contratou um plano de internet de R$ 50 em conjunto com uma vizinha. “Não é das melhores, mas quebra o galho. Como a internet é via rádio, tem muita interferência à noite ou durante o dia quando chove”, disse Wellisson, que deixou de morar com os pais quando entrou para a faculdade.

“Minha família sempre me incentivou a estudar. Meus pais moram em outra casa numa zona rural. Fui morar com meus avós porque era mais fácil para ir para a faculdade”, conta. O pai de Wellisson é analfabeto e a mãe estudou apenas até a 4ª série do ensino fundamental. Na casa dos avós moram também outros familiares. A renda é de dois salários mínimos para 13 pessoas. Ele é o único que usa o computador e acessa o Facebook diariamente.

Hoje, Wellisson está desempregado, mas, desde que começou a estudar, trabalha na área da educação. “Não tenho nada fixo, mas faço alguns trabalhos às vezes, como substituir um professor”, conta. Wellisson comprou seu computador com o dinheiro que juntou com uma bolsa do governo. Pagou R$ 1,3 mil à vista pela máquina. Ele conta que Lucrécia é uma cidade muito pequena, com pouca oferta de emprego. “As famílias se mantêm por meio da agricultura e de programas do governo federal”.

Influência
Wellisson influenciou o irmão Wandeson Van Alves, de 21 anos, a comprar um computador. Ele mora com os pais na zona rural, mas começou a cursar letras na UERN em 2010 e viu a necessidade de ter um PC. Três meses depois de entrar na faculdade, o pai de Wandeson, que ganha um salário mínimo, comprou um netbook para ele.

Durante alguns meses, o estudante usava a máquina apenas para trabalhos acadêmicos. Porém, há 7 meses, resolveu comprar um modem da única operadora na região para se conectar à rede. “Quando preciso fazer algo mais pesado, que exige mais da internet, como baixar vídeos, eu uso o computador do meu irmão”, conta Wandeson, que ganha R$ 200 em uma bolsa da faculdade. “Uso o chip do meu celular pré-pago para acessar a internet pelo computador. Pago R$ 0,50 por dia”.

Wandeson tem perfil no Facebook há 3 anos e gosta de visitar portais de notícias, blogs e checar e-mails. “Quando coloco crédito no chip, acesso a internet todos os dias. Gasto cerca de R$ 15 por mês”. O estudante conta que quando chega o inverno, a internet fica muito ruim por causa da chuva. “A página do Facebook demora uns 5 minutos para abrir”, disse. Os pais nunca usam o seu computador. Quando eles precisam de algo que o PC pode ajudar, Wandeson faz para eles.

Pouco interesse
Na região da Serra Gaúcha, o Ibope descobriu uma série de municípios que têm renda média alta, em comparação às outras cidades brasileiras, mas cuja penetração à internet é menor do que a esperada. Aplicando o conhecimento da escolaridade, o estudo identifica outros fatores para o baixo acesso, que interferem no interesse pela internet: são regiões muito rurais ou com grande parte da população idosa, por exemplo.

É o caso de Nova Roma do Sul (RS), a 160 km de Porto Alegre. A renda média da população é de R$ 2,4 mil, o que levou o Ibope a projetar 48% dos domicílios com internet. Na prática, entretanto, apenas 21% das casas têm acesso à web. Nessa cidade da Serra Gaúcha, 65% das pessoas não têm instrução, e apenas 5% têm curso superior completo.

Sem computador em casa, Luciano Sartori, de 30 anos, acessa a internet em Nova Roma do Sul pelo smartphone. Ele decidiu comprar um Galaxy SII, da Samsung, por influência dos amigos, que também têm bons celulares. Sartori pagou R$ 700 pelo aparelho em uma loja em Caxias do Sul, cidade de mais de 400 mil habitantes que fica a 50 km de Nova Roma do Sul. O município onde Sartori mora tem menos de 4 mil habitantes e a população vive basicamente da agricultura, principalmente do cultivo de uvas.

Sartori mora com a mãe e trabalha em uma balsa da prefeitura que transporta carros entre sua cidade e Nova Pádua (RS). Para completar a renda mensal que varia entre R$ 2 mil e R$ 2,5 mil, ele cria cavalos e bois em uma chácara que tem há cerca de 8 anos. Sartori não fez faculdade, mas tem ensino médio completo, diferente da mãe, que não chegou a completar o ensino fundamental.

Antes do Galaxy, Sartori tinha o modelo C3, da Nokia. Ele começou a acessar a internet pelo celular há quase 2 anos, mas não tem muito interesse em entrar na rede. A irmã, que mora em uma casa ao lado da sua, tem computador e internet em casa e era onde Sartori acessava antes do smartphone.

“Tenho Facebook há pouco mais de um ano. Como gosto de cavalos e rodeios, sempre acesso o site da ABBC – Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos – para ver notícias, além de pesquisar sobre cavalos”, conta. “Mas não uso muito [a internet]. Acesso todos os dias, mas fico pouco tempo”. No smartphone, Sartori também tem o aplicativo do Banco do Brasil, para acessar sua conta bancária.

Fonte: G1

 

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