Mais cara da Copa, arena de Brasília acumula críticas e irregularidades

Estádio Mané Garrincha / ReutersErguido inteiramente com dinheiro público, o Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha será inaugurado neste sábado em meio a dúvidas sobre sua viabilidade econômica e críticas à estratégia do governo do Distrito Federal (DF) para cobrir os custos da construção.

O estádio, que tem sido apresentado pelo governo local como o mais moderno do país, abrigará a abertura da Copa das Confederações, em 15 de junho, e sete partidas do Mundial de 2014.

Trata-se da arena mais cara erguida para a Copa do Mundo, levando-se em conta os gastos já efetuados até agora nas construções e também as projeções atuais para os gastos em todos os estádios. O valor que a Terracap – agência imobiliária pública controlada pelo Distrito Federal e pela União – já desembolsou para financiar o Mané Garrincha soma R$ 1,2 bilhão, segundo o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF).

Críticos apontam irregularidades na obra detectadas pelo TCDF e temem que a arena seja subutilizada após os torneios.

O montante, diz o tribunal, deverá alcançar R$ 1,6 bilhão quando forem executadas as obras de acabamento e sinalização do estádio, além da reforma de seu entorno.

Irregularidades

Inicialmente, o Mané Garrincha estava orçado em R$ 696 milhões. Segundo o TCDF, houve 19 aditivos na construção. O tribunal diz ter identificado sobrepreço em compras e pagamentos por serviços não executados, entre outras irregularidades.

Já o governo do Distrito Federal afirma que a elevação do valor inicial se deveu a exigências da Fifa e à execução de serviços não previstos no projeto original, como a cobertura das cadeiras.

O preço do Mané Garrincha supera os gastos com a reforma do Maracanã, no Rio, que até agora consumiram R$ 1,1 bilhão. Com 76 mil lugares, o estádio carioca é o maior do Brasil. O Mané, com 70 mil assentos, é o segundo.

Contudo, enquanto o Maracanã abrigará a final do Mundial e, após o torneio, poderá ser usado pelos grandes times do Rio, a arena brasiliense sediará jogos menos importantes da Copa e fica numa cidade sem tradição futebolística.

Em sua inauguração, o Mané Garrincha abrigará a final do campeonato local, o Candangão, entre Brasiliense e Brasília. A média de público do torneio beira 1 mil pessoas por jogo, e o Distrito Federal não tem nenhum time na primeira divisão do campeonato brasileiro. Seu clube mais bem posicionado nacionalmente, o Brasiliense, disputará neste ano a terceira divisão do torneio.

O governo do DF espera atrair jogos de clubes maiores para o estádio. Em 26 de maio, Santos e Flamengo disputarão no Mané Garrincha a partida inicial do Campeonato Brasileiro, num evento que servirá de teste para a Copa das Confederações.

Arena ‘multiuso’

Ainda assim, segundo o governador Agnelo Queiroz (PT-DF), a arena não dependerá do futebol. “Não é um estádio de futebol. Vai ter até futebol, mas será uma arena multiuso, um importante centro esportivo, cultural e comercial”, disse ele em entrevista coletiva recente, quando o Mané Garrincha foi apresentado a jornalistas de veículos estrangeiros.

Agnelo afirma que o estádio receberá shows frequentes e abrigará lojas, restaurantes, bares, cinemas e teatro. “Vamos atrair grandes eventos do país e internacionais”.

Questionado sobre o custo de manutenção do Mané Garrincha, o governador não citou valores, mas disse que o estádio é dotado de sistemas que pouparão o consumo de água e energia.

Mesmo que a arena venha a gerar receitas que cubram sua manutenção, há dúvidas quanto à capacidade da Terracap de recuperar os gastos com a obra.

A agência pública arcou sozinha com os custos da arena, já que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que financia todos os outros estádios da Copa, não concordou com o projeto. Para executar a construção, a Terracap contratou as empreiteiras Via Engenharia e Andrade Gutierrez.

Na apresentação do estádio a jornalistas, o presidente da Terracap, Antônio Lins, disse que a companhia tem um “fluxo de caixa invejável” e que a obra não abalou suas contas. Pouco antes, o governador Agnelo Queiroz afirmou que a Terracap pode recuperar o investimento “vendendo um único terreno, na 901”.

Acontece que o local mencionado – a quadra 901 do Setor de Grandes Áreas Norte (SGAN), em ponto bastante valorizado da região central de Brasília – é hoje uma extensa área verde que, segundo moradores e o Ministério Público, deve permanecer sem construções.

Em 2011, Agnelo anunciou os planos de leiloar o terreno para a construção de um complexo de hotéis, numa extensão do Setor Hoteleiro Norte. No ano seguinte, porém, a pedido do Ministério Público, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal determinou que o governo suspendesse o projeto.

Segundo o juiz Carlos Rodrigues, a construção só poderá sair do papel se autorizada por lei distrital e respaldada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), a quem caberá avaliar se ela respeita a concepção urbanística de Brasília. A consulta ao Iphan é necessária porque Brasília é tombada como Patrimônio Histórico Nacional.

Riscos ao plano-piloto

Mas o Iphan e a Unesco, agência da ONU que em 1987 conferiu à capital o status de Patrimônio Cultural da Humanidade, condenaram a construção. Técnicos da Unesco que visitaram a cidade em 2012 afirmaram em relatório que a expansão do setor hoteleiro resultaria “em uma mudança séria em relação à planta original desenhada por Lúcio Costa”.

Sem poder levar o projeto adiante, a Terracap tem contado com leilões de outros terrenos para fazer caixa. Desde 2012, a empresa pôs à venda mais de 200 lotes, em sua maioria em cidades-satélites, arrecadando ao menos R$ 90 milhões.

Para Marisa Isar Machado, promotora do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), o governo distrital está “dilapidando seu patrimônio para bancar o estádio”.

O MPDFT e o Tribunal de Contas apontaram irregularidades em parte das últimas licitações de terrenos públicos e conseguiram, no mês passado, suspender um leilão que previa arrecadar mais de R$ 100 milhões com a construção de um shopping no Lago Sul, área nobre de Brasília.

As disputas, que devem continuar pelos próximos meses, refletem ainda a demanda de construtoras por novas áreas na capital federal.

Em entrevista recente ao jornal Correio Braziliense, o empresário e ex-senador Paulo Octávio, um dos principais nomes do mercado imobiliário local, referiu-se assim ao mais valioso bem de Brasília: “No Rio de Janeiro, eles têm o petróleo. Nós temos a terra”.

Fonte: BBC Brasil

Blog do Deputado Federal GONZAGA PATRIOTA (PSB/PE)

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