Pesquisadores criam técnica para acabar com o desconforto da mudança brusca de fuso horário

21Ir para outro país com fuso horário muito diferente costuma gerar dificuldades de adaptação na rotina e desconfortos, como insônia, cansaço e estresse. O quadro, muito bem conhecido por quem costuma fazer longas viagens, é chamado de jet lag. Um grupo de pesquisadores da Universidade de Michigan (EUA) recorreu à matemática para combater o problema e ajudar as pessoas a se adaptarem mais rapidamente aos novos horários. Publicado nesta semana na revista Plos One, o estudo apresenta uma série de equações que permitiram aos autores elaborarem um regime de exposição à luz, que, ao ser seguido, ajudará as pessoas a sentirem o mal-estar por menos tempo.

O jet lag é resultado de um desajuste entre o relógio interno da pessoa — os chamados ritmos circadianos (veja arte) — e o ambiente externo. O maior regulador desse relógio biológico é a luz, afirmam os especialistas. Quando está dia, a claridade dispara uma série de processos no organismo. A chegada da noite, e a consequente diminuição da luminosidade, causa outros efeitos, incluindo a sensação de sono. Quando alguém viaja para um ponto distante, há um descompasso. O corpo está em um ritmo, mas o ambiente envia sinais discordantes.

Diferentes estudos já propuseram estratégias de exposição alternada a ambientes claros e escuros para promover a adaptação. Os autores da nova pesquisa, contudo, acreditam ter encontrado uma maneira de fazer isso em um período mais curto. “Muitos têm tentado reduzir o jet lag, e outras programações de iluminação foram propostas no passado para ajudar o corpo a se adaptar. Nossos horários se destacam por trazer a adaptação de forma mais rápida”, diz Olivia Walch, coautora do trabalho.
Com base em dois modelos matemáticos, os cientistas mediram com precisão os ritmos circadianos humanos, analisando vários marcadores biológicos, como a temperatura corporal — reduzida quando o corpo necessita dormir. Os vários cálculos resultaram em tabelas que permitem programar horários aos quais o viajante deve se expor ou não à luz para reajustar sua rotina.

Em determinado momento, por exemplo, é preciso ficar em uma claridade fraca sem, no entanto, dormir. Isso é possível saindo na rua com óculos escuros. Se o horário pedir luz forte, mas for noite, pode-se recorrer à luz artificial intensa. “Nossos horários mostram quando as pessoas devem ‘estar’ na luz e quando evitá-la, de modo que elas se movam sempre em direção ao alvo (a equiparação entre os ritmos biológicos e o ambiente)”, completa Walch. “É tudo uma questão de tempo. Se você recebe a luz em um ponto do seu ritmo diário, ela pode empurrar o relógio para a frente ou para trás.”

Temperatura corporal
De acordo com Fabio Maraschin, diretor médico do Centro de Distúrbios do Sono de Porto Alegre (Pneumosono), ao manipular a exposição da luz, a temperatura corporal pode mudar e, desse modo, induzir ou não as pessoas a sentirem sono, graças a produção de um hormônio específico. “A exposição de luz pela retina inibe a produção da melatonina, que é produzida pelo cérebro e nos deixa sonolentos e com a temperatura corporal mais baixa. É fácil de notar isso quando passamos a noite em frente a um computador ou vendo televisão. Somos estimulados a nos manter alertas pela luminosidade. Com base nesses mecanismos, os pesquisadores chegaram a esses horários”, destaca o pesquisador, que não participou do estudo.

Para Maraschino, agendamento pode mesmo ajudar a lidar com o jet lag e até com outros problemas. “Além da mudança de fusos, temos também casos de pacientes que possuem dificuldades como o distúrbio de fases do sono, que ocorre quando as pessoas só conseguem dormir em horários incomuns, como de madrugada. Já sabíamos que essa manipulação à exposição da luz poderia ajudar, porém não tínhamos como saber em que horários e em que quantidades. Com essa novidade, acredito que muito poderá ser feito.”

Alarmes automáticos
Os cientistas de Michigan realizaram testes com voluntários e atestaram a utilidade do método. Mas, como cada indivíduo necessita de uma programação personalizada, afinal cada viajante tem um destino e uma quantidade de horas a compensar, seria inviável publicar uma tabela a ser seguida por todos os interessados.
Assim, a solução encontrada pelos autores do estudo para colocar o conhecimento adquirido em prática foi desenvolver um aplicativo de celular com mais de mil opções de viagens. Batizado de Entrain (arrastar, em inglês), o programa permite que o usuário insira dados como local de partida, destino, hora de chegada, previsão do tempo (ensolarado, chuvoso etc.) e, assim, receba um agendamento personalizado, com lembretes anunciados pelo smartphone.

Walch explica que o aplicativo, já disponibilizado gratuitamente na AppStore (mais informações em www.entrain.org) também poderá fornecer mais dados para a continuidade do estudo. Para colaborar, basta o usuário aceitar que suas informações sejam automaticamente enviadas para a equipe de pesquisadores. “Queremos ver se as pessoas podem seguir os horários ou se elas são muito difíceis de serem obedecidas. Também desejamos confirmar (com mais pessoas) se os sintomas do jet lag são reduzidos como esperamos.”

Felipe Henning, endocrinologista e diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (SBEM-SP), conta que a proposta dos americanos já é usada em consultórios para pessoas que se queixam de problemas como o jet lag, mas pode facilitar a vida de quem não consegue mudar sua rotina facilmente. “A restrição do sono em busca de horas extras de trabalho, por exemplo, tem provocado danos graves à saúde do brasileiro, como a hipertensão e a obesidade, por exemplo. É essencial frisar para as pessoas a necessidade de dormirem quando devem para evitar problemas mais graves que podem ser muito prejudiciais para o organismo”, completa.

Adaptação difícil
“O que os pesquisadores buscaram foi encontrar formas de artificialmente confundir nosso relógio biológico, para que o ciclo de sono-vigília não se modifique por meio da manutenção do ritmo circadiano. Essa estratégia já é conhecida e sabidamente eficaz. Eles pretendem facilitar e otimizar a aplicação desta tática através de um aplicativo. Acho válido, mas, muitas vezes, não é possível seguir as recomendações de exposição solar. O aplicativo parece ser bom, mas depende da natureza. Em locais com baixa exposição solar, possivelmente não se conseguirá a quantidade necessária de exposição aos raios luminosos. Isso, porém, não torna o aplicativo inútil, muito pelo contrário, ele certamente auxiliará.”
Ronaldo Maciel Dias, neurologista do Hospital Santa Luzia

Fonte: Diário de PE

Blog do Deputado Federal GONZAGA PATRIOTA (PSB/PE)

 

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