Uma relíquia em pergaminho
- By : Assessoria de Comunicação do Deputado Gonzaga Patriota
- Category : Clipping
Filho apegado ao colo do pai, curto minha rotina de pegar 386 km rumo a Afogados da Ingazeira, no Sertão do Pajeú, duas vezes ao mês, para beijar a minha joia que fará, no próximo dia 22, 92 anos. E a cada viagem, nas conversas intermináveis com meu mestre dos mestres Gastão, descubro tesouros.
Alguns, que brotam da sua memoria invejável. Outros, do fundo seu baú. Num dos últimos momentos de mergulho no seu passado, papai retirou de um velho cofre, que mantém em sua lojinha comercial, no velho Beco de Zezé Rodrigues, os computadores do seu avô: velhas cadernetas em papel pergaminho.
Relíquias que o tempo, com a sua capacidade implacável de destruir, foi vencido. Folheando-as, encontrei anotações que meu avô Augusto Cerquinha, pai do meu pai, fazia do seu comércio de alpargatas e da família. Como a família era muito grande, verdadeira prole, ele anotava a data de nascimento de todos os filhos, um a um.
Foram 14! Reprodutores como naquele tempo não existem mais. No século passado, o homem seguia literalmente os ensinamentos bíblicos e povoavam o mundo sem cerimônia. Papai está lá nos escritos do seu Augusto: Gastão nasceu em 15 de abril de 1922.
Vendo que também iria perder o controle da filharada – nove ao todo – meu pai seguiu rigorosamente o exemplo do meu avô e adotou a sua caderneta.
Vi lá, com os meus olhos que esbugalham para os ensinamentos do meu pai, todas as datas de nascimento dos seus filhos. E uma curiosidade: papai anotava também as datas de todas as vacinações dos filhos.
Como cuidava dos filhos com uma devoção de paizão, quando faltava uma determinada vacina na cidade ele levava os filhos urgentemente para vacinar no Recife.
De trem, vale salientar, levando poeira na cara, 15 horas, para botar os pés na capital. Até hoje, beirando a casa dos 92 anos, meu pai cuida dos filhos como se fossem ainda bebês, tamanho o seu zelo e a sua paixão.
Mas filhos se criam para o mundo. Em seu livro O Profeta, Gibran Khalil Gibran escreveu que os filhos são flechas e os pais arcos. Disparadas as flechas, elas voam para longe do arco. E o arco fica só.
Infelizmente, esse é o destino de todos os pais: a solidão. Não é solidão de abandono. E nem a solidão de ficar sozinho. É a solidão de ninho que não é mais ninho. E está certo. Os ninhos deixam de serem ninhos, porque outros ninhos vão ser construídos.
Os filhos partem para construir seus próprios ninhos e é a esses ninhos que eles deverão retornar, como retorno na maior felicidade, sempre que possível e necessário, o caminho da minha Pasárgada para beijar a pedra.
Fonte: Magno Martins
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