Vilarejos para reassentar vítimas da tragédia de Mariana não saíram do papel

Barra Longa (MG) - Ruínas de Gesteira, no distrito de Barra Longa, dois anos após a tragédia do rompimento da Barragem de Fundão, da mineradora Samarco (José Cruz/Agência Brasil)Enquanto a imagem de destruição dos três distritos atingidos pelo rejeito da mineradora Samarco – Bento Rodrigues, Paracatu e Gesteira – permanece viva na memória e nas antigas comunidades soterradas dois anos depois da tragédia de 5 de novembro de 2015, ainda não é possível vislumbrar as novas vilas a serem construídas para abrigar as vítimas. Os desenhos urbanísticos estão em processo final de elaboração.

Agência Brasil visitou os territórios soterrados pela lama que se espalhou com o rompimento da Barragem de Fundão, conversou com moradores que perderam não só casas, mas a memória e o modo tranquilo de vida. A ansiedade pela entrega dos novos distritos provoca depressão. Uma expectativa de colocar as lembranças de dois anos atrás onde devem ficar: vivas, mas no passado.

Cruzes e raiva 

A placa de 30 quilômetros por hora, em meio a casas destruídas e mato crescido em Bento Rodrigues, na cidade mineira de Mariana, recorda a tranquilidade do distrito de outrora. O topo do morro ainda guarda a histórica igreja de Nossa Senhora das Mercês intocada, o único vestígio de alegria que os moradores sempre citam ao contar sobre o local antes que a lama da mineradora Samarco soterrasse a tranquilidade da região.

O sentimento estampado nas ruínas agora é outro: raiva, nas pichações feitas na parede da Escola Municipal de Bento Rodrigues contra a Samarco. Dor, na encruzilhada cercada de cruzes de madeira instaladas pelos moradores, onde também foi colocada uma placa nova em folha, com uma mensagem tardia: orientações de emergência para o caso de um desastre.

O que restou da histórica capela de São Bento, de 1718, está embaixo de um galpão, ao lado das ruínas do Bar da Sandra, famoso para os que faziam turismo na região. As casas que não foram atingidas pela lama acabaram condenadas pela Defesa Civil e tiveram janelas, portas e outros itens saqueados ou retirados pelos moradores. Mas as maiores cicatrizes da tragédia são os cinco mortos do vilarejo – quatro moradores e uma visitante.

Expedito Lucas da Silva, de 47 anos, é a pessoa da comunidade que vai com mais frequência até lá. Na mente, ainda consegue rever um tempo em que a população era unida, como uma família. “Todos que morreram em Bento, eu conhecia. A Emanuely [Vitória, de 5 anos], que estudava com minha menina. Todos eram conhecidos, eu ia na casa deles. É muito forte”, conta.

Desde então, os atingidos se mudaram para casas mobiliadas e alugadas pela Samarco, até que as vítimas sejam reassentadas em novos vilarejos. São 362 famílias de Bento Rodrigues e Paracatu, distritos de Mariana, e Gesteira, de Barra Longa. O choque cultural e a separação da vizinhança gerou sofrimento para os moradores.

“Sinto tristeza em ver as pessoas tristes, as crianças, os mais velhos. Como se tivesse aprisionado. Você é acostumado em lugar pequeno, conhece todo mundo, tem amizade, conversa com todo mundo. Hoje tá um para cada canto. O mundo não consegue ver isso, esse sentimento que traz. Às vezes, vê pela parte do dinheiro, porque você tá recebendo um auxílio financeiro, mas não é tudo. Tem coisa que vai além do dinheiro”, diz Expedito.

Fonte: AB

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