Acidentes de trânsito e a chamada Lei Seca
Fiz na tribuna da Câmara dos Deputados, nesta sexta feira (10), um discurso no Grande Expediente e, apresentei uma retrospectiva do trânsito no Brasil nas duas últimas décadas, mostrando o que ele era com o velho Código Nacional de Trânsito, de 1966 e o que ele é ele hoje, com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) que ajudei a elaborar, como Secretário Nacional de Trânsito, nos anos de 1993 e 1994.
Na ocasião, mostrei que a violência do trânsito no Brasil pode ser demonstrada em números. Por ano, mais de 30 mil pessoas morrem em decorrência de acidentes de trânsito. Numa lista de causas de desastres, a ingestão de álcool aparece entre os sete vilões das estradas e ruas do país. Não se pode negar que motoristas alcoolizados potencializam a gravidade dos acidentes. O álcool é um forte depressor do Sistema Nervoso Central, por isso, quem bebe e pega o volante tem os reflexos prejudicados. Fica mais corajoso, mas reage de forma lenta e perde a noção de distância. Quando é vítima de desastre de trânsito, resiste menos tempo aos ferimentos, já que as hemorragias quase sempre são fatais.
No entendimento dos legisladores, o ato de dirigir é incompatível com o de beber. Estudos científicos comprovam que a ingestão de álcool provoca perda de reflexos, confusão mental e euforia, entre outros que, isoladamente ou em conjunto, podem levar a um acidente.
Em razão disso, o Governo Federal passou a tratar o tema como questão de segurança e saúde pública. A princípio, proibindo a venda de bebidas alcoólicas em rodovias federais, medida que feria dispositivos constitucionais e, por isso, ensejou uma ampla discussão no Parlamento que resultou na implantação da Lei nº 11.705/2008, a chamada “Lei Seca”.
No Brasil, como em mais de cem países do mundo, existem leis que visam coibir o consumo de bebidas alcoólicas em determinadas situações ou períodos. Um exemplo disso é a restrição de consumo de álcool imposta durante as eleições. Esse expediente é usado também por muitas cidades numa tentativa de conter os índices de violência. Geralmente em dias úteis da semana, no período da madrugada, os bares são proibidos de funcionar e o comércio de bebidas, reprimido.
A “Lei Seca”, modificou o Código de Trânsito Brasileiro, para proibir o consumo da quantidade de bebida alcoólica superior a 0,1 mg de álcool por litro de ar expelido no exame do bafômetro (ou 2 dg de álcool por litro de sangue) por condutor de veículo, ficando esse condutor transgressor sujeito a pena de multa de R$ 957,00, perderá a carteira de motorista por um ano e ainda terá o veículo apreendido, a suspensão da carteira de habilitação por 12 meses e até a pena de detenção, dependendo da concentração de álcool por litro de sangue. Para alcançar essas penalidades, basta beber uma única lata de cerveja ou uma taça de vinho.
Sob pressão do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em novembro de 2011, entrou em análise um projeto para endurecer a Lei Seca. Esse Projeto de Lei determina que dirigir sob efeito de qualquer nível de álcool passa a ser considerado crime e determina que a prova contra quem se recusar a fazer o bafômetro pode ser feita através de testemunhas, vídeos ou imagens.
Atualmente, a falta de fiscalização intensiva faz com que a chamada “Lei Seca” não seja respeitada por muitos motoristas. No entanto, pela legislação atual, o motorista pode se recusar a fazer qualquer teste, já que, no Brasil, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Nesse caso, porém, o condutor sofrerá a mesma punição destinada a pessoas comprovadamente alcoolizadas – ou seja, multa de R$ 957,00 e suspensão do direito de dirigir por um ano. Esse, aliás, é um ponto polêmico da lei, porque se o motorista se negar a fazer o exame, entrando posteriormente com um recurso na Justiça, não vai lograr êxito, pois a lei prevê que o testemunho do agente de trânsito ou do policial rodoviário tem força de prova perante a justiça.
Só no Natal e réveillon, do ano passado. 2011, morreram nas rodovias federais mais de 200 pessoas, em quase cinco mil acidentes. Este número triplicou quando somados aos acidentes e mortes nas estradas estaduais e nos perímetros urbanos das grandes e médias cidades brasileiras, durante essas festas de final de ano.
Os veículos brasileiros são os melhores e mais seguros do planeta. O nosso Código de Trânsito é rígido. São muitas as exigências para se adquirir uma Carteira Nacional de Habilitação. Por outro lado, a chamada “Lei Seca” também não favorece quem bebe e dirige.
E o que falta para diminuir essa carnificina no trânsito brasileiro? Fiscalização, fiscalização e fiscalização! Nas rodovias estaduais isso não existe. São mais de 60 mil quilômetros de rodovias federais com menos de dez mil policiais. Postos fechados, viaturas nas garagens e a malha sem policiamento, por falta de efetivo.
Não sabemos onde estão os milhões de reais arrecadados com as multas de trânsito e do FUNTRAN – Fundo de Trânsito, nas três esferas do Poder. Pela lei, esses valores deveriam ser aplicados em educação, engenharia e melhoramento de trânsito, mas, pelo que vemos, parece que são desviados para outras atividades.
Diante dessas tragédias, é decisiva a mobilização da sociedade e dos governos em favor da adoção de metas de redução de acidentes, com um cuidado cotidiano de fiscalização, educação e aperfeiçoamento da legislação de trânsito.
Por outro lado, um plano de segurança no trânsito deve passar por maior atenção dos governos no Brasil, de tal forma que destinem recursos para a aparelhagem das polícias, para a produção de mais estudos e estatísticas das causas dos acidentes e, também, para a mudança de comportamento de todos, especialmente dos condutores de veículos e de motociclistas. As autoridades brasileiras tem a obrigação de mudar esta triste realidade que muitas vezes nos condena a enterrarmos nossos jovens e inocentes, vítimas do asfalto, da velocidade e da imprudência.
Se não houver, por parte dos governos uma política de humanização no setor de transporte e de trânsito no Brasil, a tendência é que a epidemia dos traumatizados por acidentes de carros e motos se agrave a cada dia, produzindo, diariamente, perdas desnecessárias e muita dor e sofrimento aos familiares e amigos dessas vítimas do acaso, por isso, não há tempo a perder, nem vidas a desperdiçar sob rodas de irresponsáveis que insistem em aliar bebida alcoólica e direção. Agora, se beber e dirigir terá de prestar contas à justiça. A certeza da punição constitui o maior inibidor de aventuras irresponsáveis.
GONZAGA PATRIOTA é Contador, Advogado, Administrador de Empresas e Jornalista, pós graduado em Ciência Política e Mestre em Ciência Política e Políticas Públicas e Governo e Doutorando em Direito Civil. É Deputado desde 1982.
Blog do Deputado Federal GONZAGA PATRIOTA (PSB/PE)
Nenhum comentário